terça-feira, 1 de maio de 2012

Cometa, um poema de Didi Câmara.


Luiz Gonzaga Cortez


Pegando carona nas crônicas publicadas na imprensa natalense, andei procurando nos meus papéis velhos, alguma coisa sobre a poetisa Didi Câmara. Encontrei pouco, mas continuo procurando as cartas que ela teria enviado para a minha mãe, Maria Natividade Cortez Gomes, sua amiga de infância, em Natal. Irmãos mais velhos me informaram que elas se corresponderam muito há 30/40 anos atrás. Didi Camara no Rio de Janeiro e Nati Cortez, como era mais conhecida, na Rua Felipe Camarão, Cidade Alta, em Natal. Quando menino, eu ouvia falar sobre duas amigas de minha mãe: Lilia Galvão e Didi Câmara. Dona Lilia eu conheci, morou em frente à nossa casa. Eu não me lembro de dona Didi Câmara, mas há quem afirme que ela visitou mamãe, aqui, na província potengina. Já achei várias cartas remetidas para ela (Nati), mas não achei as de Didi Câmara. Entretanto, encontrei uma edição incompleta da revista JURITI, editada por Aluizio Macedônio Lemos, chefe integralista de Ceará-Mirim/RN, com um poema de Didi Câmara. A revista não tem páginas numeradas nem a data da edição, mas, presumo, que seja de  novembro ou dezembro de 1938, pois traz uma notícia sobre as comemorações do 1º aniversário do golpe de estado que implantou a ditadura do Estado Novo em 10 de novembro de 1937.
Chama-se “COMETA” o poema de Didi Câmara, oferecido ao Padre Luiz Gonzaga do Monte. Transcrevo, conforme o original publicado,  o poema escrito décadas antes do nascimento do compositor e cantor Raul Seixas e do movimento dos ufologistas.       
“Nasci  numa longínqua nebulosa,
Há milhares de séculos passados,
Em pleno céo aberto e infinito.
Sou filho vagabundo dos espaços
E irmão das estrelas.
Percorro lesto distancias inauditas,
Dentro do caos profundo deixo rastros
De luz e uranolitos.
Se o que vi podesse, eu vos diria,
Dentro de minha vida luminosa,
Desde que vim da erma nebulosa,
Que já nem sei onde está...
E que foi o meu berço colossal,
Feito de ouro, verde e cor de rosa:
Em volteios gracis, qual fulgurante
Aza ciclópica de gigantesca ave.
Pelos espaços vi alviçareiros mundos,
Que giram sobre, e pelos céos profundos,
Da estrada eterna a interminável senda:
Globos acesos e volteando aos pares
Quais falenas de prata, aos milhares,
Numa dansa fantástica de luz
Toquei o solo rubro de estrelas,
Onde colhi encantos de mil cores,
A corôar minha cabeça e onde puz
Mais formosos matises, como flores.
Vi delírios de fogo, altas chamas,
Tempestades astrais, igneas tragedias,
Onde desapareceram de repente,
Os mais lindos sois.
Contemplei as batalhas siderais,
Onde cada soldado é uma estrela,
Que disputa um sistema em formação...
E seguirei sempre aventureiro de luz,
Pelos espaços infindos, eternamente abertos
Pelos céos de safira sempre azuis...
Até que um dia nessa marchar exul,
Possa tomar-me um sol no seu bojo de chama
E sepultar-me a fluida cabeleira,
Numa formosa e rubra sepultura,
Que ao choque de meu corpo ainda mais se inflar
Em torrentes de fogo pela altura!”.
Notas: As expressões “ lesto”, “exul” e “gracil” não são erros de revisão. Estão registradas no “Aurélio” há décadas, informa Nei Leandro de Castro. Eu desconhecia, mas lesto significa rápido, ligeiro, ágil  grácil é o mesmo que  delicado, delgado, fino, sutil.  Exul, o mesmo que exule, é exilado, desterrado.  Creio que o final do bonito poema seja “Em torrentes de fogo pelas alturas!”. Franklin Jorge escreveu que esteve no Rio de Janeiro, em 1970, num dia de jogo da seleção brasileira e encontrou Didi Câmara com várias amigas e que não deu importância ao visitante, mas lembra-se de que falou sobre Natal e Nati Cortez, tendo dona Didi comentado que isso é coisa muita antiga, que já passou, etc.  Tudo bem, está certo Franklin quando diz que ela não o recebeu bem. Já a minha irmã, Cecília, que reside no Rio de Janeiro desde 1974, disse-me que naquele ano, visitou Didi Câmara com mamãe e que ela recebeu muito bem, tomou chá com a gente, que riu muito quando conversaram sobre Natal da infância delas. “Pareceu uma mulher muito simpática, risonha e era amiga de amãe. Só a vi uma vez, apesar de morar bem pertinho, na Tijuca. Na ocasião, ela estava com uma filha e uma neta,que devem morar  aqui ainda, mas não me lembro do endereço dela”, disse Cecília Cortez Gomes. Didi Câmara foi da juventude feminina integralista, em Natal/RN.
Luiz Gonzaga Cortez Gomes, jornalista e pesquisador.
Texto redigido em  17.04.2010.

Nenhum comentário:

Postar um comentário